segunda-feira, 20 de outubro de 2014
DESAPEGOS
LUIZ MARTINS DA SILVA
Olhando, assim, de relance
Para um mundo mais humano,
Ouço um passarinho insistente,
À borda de uma varanda:
'Não sei dia, mês e ano."
Olhando, assim, para a vida,
No topo de uma montanha,
Ouço um peixe bem aquífero,
Desde o seu manto azulado:
"Não sei o que é uma lágrima."
Olhando, assim, para a noite,
De mar e céu estrelado,
Dos confins de alto a baixo,
Ouço um astro coruscando:
"Pouco me diz o meu fardo.
Olhando assim para o tempo
E todas as suas pinturas,
Penso no acaso do vento,
Sem trambelho ou compostura:
"Sou a moldura do nada."
Olhando, assim, para um copo,
Ainda cheio de água,
Sou filho, sou pai, sou corpo,
Este agora: enrodilhado:
"Logo passa a tempestade."
quarta-feira, 15 de outubro de 2014
PROFESSAR
LUIZ MARTINS DA SILVA
Para Marias, Josés e Malalas
Vai, audacioso
Ter a pretensão de ensinar
O que todo o mundo
Não sabe por inteiro.
Vai, Prometeu,
Professar proficiência
De futuros , não confessos,
Ninar, com fervor, os embriões.
Vai, profeta,
Arauto de assertivas,
[ora et labora]
No lapidar dos egos.
Volta, sempre, humilde
Ao afeto que se encerra
No saber que, amanhã,
Gerânio mais floridos.
domingo, 12 de outubro de 2014
A CIGARRA
LUIZ MARTINS DA SILVA
[ Composição atonal para sete notas ]
Dó
Ausência de um ano:
Retorno certo
Ao mesmo tronco.
Ré
Estribilho de azul :
Incloncluso ensaio
De canto coral.
Mi
Enigma infantil:
Todas mortas,
Todas de volta.
Fá
Da larva ao cerne,
Ciclo de seiva,
Rondó cósmico.
Sol
Diapasão de luz:
O disco se grava,
Todo verão.
Lá
Divisão de turno:
O macho canta,
A fêmea escuta.
Si
Se fosse música:
Começo e fim...
Partitura, não; clave sim.
Imagem- Animal planet Discovery
MEMO
Luiz Martins da Silva
Trocar medicação por meditação
Conhecer as veredas do cerrado
Alguém sabe aonde termina o sertão?
Fazer de cada dia a Santa Ceia.
Ver o que as pessoas têm de mais.
Ser mais irmão e Anjo da Guarda.
Fazer de meia -dúzia mais que seis.
Visitar desconhecidos enfermos.
Pedir perdão aos abestados.
Descobrir virtudes nos simplórios.
Acender a luz na aldeia dos infames.
Uma vez por mês amanhecer no bosque.
Conversar sobre música com os pássaros,
Discutir a saúde com as pragas.
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