segunda-feira, 19 de junho de 2017

O FOGO É FADO



 [A propósito de uma foto do Diário de Notícias]
Luiz Martins da Silva

Quando os fogos ateiam línguas,
Dialeto das labaredas,
Por vezes, de causas irônicas,
A imprevisível trama dantesca,
Próprias da cena britânica,
Ou do fado português...


O que querem de nós as chamas,
Quando, na fuga, o fulgor
Não sai a soneto, Camões,
Nem prece de Shakespeare?
Por vezes, o fogo é fato,
Midiático antes do luto.


Oremos, por nós, ingleses,
Franceses, alemães, brasileiros...
No incinerado das cinzas
Que que até há pouco eram sonho
E, hoje, nem de perto sombra
Do que chamamos de nada.


Tudo de nós é sofrer,
Pelo que herdamos na distância
E que honraremos na saudade;
Na memória dos que desde a infância
Fizeram com sangue, suor e lágrimas
Mais por nós do que por eles.

terça-feira, 30 de maio de 2017

PAÍS DOS PAIS




Luiz Martins da Silva



Quanta dedicação cultuo aos astros,

Sol, Lua e Estrelas, dia e noite.
Deles busco inspiração e Luz,
Qual espelho na mira de um foco.

Lar, mulher, filho, filhas... famílias

Que lá no Céu, constelações.
O Sete Estrelas, número cabal,
Tantas a contar a adormecer.

E eu coloco lá no alto o meu país,

Cada um acha o seu o Paraíso.
Que o seja, mesmo por fazer
Da nossa terra a nossa alegria.

Aqui, já nasceram os nossos pais,

De quem, na glória, ainda somos
A lhes guardar feito ícones na memória,
Do que, logo, logo, mais brilhos a contar.

Galáxias, com admiração e medo,

(Por favor, não conte para ninguém),
É nosso particular segredo.
Anda, chega aqui, som

segunda-feira, 1 de maio de 2017

PRIMEIRO DE MAIO






Luiz Martins da Silva



Disse Marx, padroeiro do trabalhador: 
" Só o trabalho produz valor".
Agora, há quem diga: ' O negócio está no ócio'. "Que preguiça!'', geme Macunaima.
"


Trabalhar em romano era tripalium,

Instrumento de tortura, mas, que doçura,
A abelha a lidar com a flor, pólen e mel,
Mania de besouro é rolar pelota.


Enquanto há digestão, a matéria come pão.

E o patrão vê no vil apego
A chama do umbigo,
O grito que não se apaga.


''Eu não vim para ser labrego'',

Resmunga, o colonizador,
Até hoje, donatário.
Dom de fazer do outro otário.



Na poesia, propôs o crítico Faustino:

Há que surgir um Andrade
Capaz de juntar os três: Mário, Oswald e Carlos.
Eu sou é gente, saruê é que é um bicho.


Não vivo nu, quando muito, ameríndio.

Reservem para mim este cantinho,
Predileto, do seu ombro, cantinho ninho
De quem dorme para sonhar com beijinhos.



Labora et ora. Ora et Labora.

Questão de laboratório.
Destino é mistério do além,
Até para quem não é beneditino.


Pintura- Tarsila do Amaral ,  (1886-1973

sábado, 29 de abril de 2017

HAICAIS FELINOS




Luiz Martins da Silva
Para Luisa Ataide


Cisma a verdade
Com o olor inodoro
Do simulacro de antiquário.



Brinca a menina com o mimo
De narizinho molhado
Que não se sabe urso, de colo.



Tocata a solo,
Colcheias de miados.
Carimbos no assoalho.



Um dia, talvez, 15 anos,
Velho o bichano,
De tanto dormir.



De dia, ficar.
De noite, sumir.
Aliado da lua.



Bicho de rua,
Teto emprestado.
Um cio, e já não vale nada.



Vão-se os pelos
Pela vida afora.
Chegará a hora, sem mais nem menos.



Por si só, elefantes.
Ninguém lhes sabe o sumiço
Quando do sétimo graal.

domingo, 9 de abril de 2017

POSTAIS







LUIZ MARTINS DA SILVA



O amor é  um abstrato plural


Que mora em um supor de nós,


Mas não é que interroga concretudes,


Teimando sabores reais ?


Existem amores antipáticos,


De almas que desejamos telepáticas


Que fiquem nos caminhos da História.


Mas, os mais remotos reclamam memórias.


E o que dizer para nós mesmos,


Quando na revelia do esquecimento,


Eis que nos aparecem, argamassa, cola,


Grudados na nossa própria sombra ?


Sobretudo os que juram nunca mais


Até parecem, combinam


Cruzamento de horizontais e verticais,


Desses que nascem e declinam para além de trás os montes.


Mas, nada melhor do que um dia atrás da noite,


]Para que retornem ao abrigo sentimental de sempre:


Gavetas que se abrem sozinhas,


Arquivo art-déco, museu de pessoas da gente.


[Da série proemas em prosa]


sábado, 1 de abril de 2017

A MONTANHA PERECÍVEL





[Decalque sobre obra de Leonilson,
Desde a “capa” de Suyan de Mattos]


Luiz Martins da Silva

Porquê montículo de areia,
Sobre a praia de brinquedo,
A criança espera a vida
E ainda bem que não atina
Que as duas, montanha e vida,
Laváveis, leváveis, louváveis.

Tão reduzida a pó,
Não era, então, a auto-estima
De saber que de tão leve
A vida parece e é
Real, mas, como flutua
Entre o mar e o céu acima.

Linda, a nacionalidade
De não se saber nessa idade
Quão invertida é a sina
De a criança crescer
Desejando que o tempo
Seja só, na montanha, um uivo.


Preto, branco, tinto, ruivo,Amarelo, nipo, sino...

Pouco importa com que roupa.
Que bobagem, sabe Deus,
Ora de botar na bagagem,
Nossa memória num adeus.

Translate

Total de visualizações de página